Um conto inédito na Ruído Manifesto

Passando aqui para compartilhar um conto novo publicado na revista Ruído Manifesto.

Pra quem curte a literatura brasileira contemporânea, a Ruído Manifesto é o lugar certo pra ficar sabendo da produção das escritoras e escritores nacionais.

Bora conhecer meu novo conto “Comigo ninguém pode”?

Um leve spoiler do que virá com o novo livro que loguinho tá dando as caras nesse mundo.

Oba!

Só clicar no link abaixo:

http://ruidomanifesto.org/um-conto-de-marina-monteiro-2/

Colaboração com o Literatura RS

Semana passada recebi o convite do Literatura RS para colaborar com o conteúdo exclusivo produzido para assinantes do projeto.

Três autores e professores de escrita criativa foram convidados a dar quatro dicas para o desbloqueio criativo. Foi um grande prazer compartilhar destas dicas com os escritores Emir Rossoni e Marcelo Spalding.

Fica aqui o convite para quem quiser conhecer o site www.literaturars.com.br que fortalece e divulga a literatura produzida no Rio Grande do Sul e também deixo o link do sistema de apoiadores: https://lnkd.in/eSjnrhcr através do qual você recebe conteúdos exclusivos pensados com muito cuidado e tem a oportunidade de colaborar com a manutenção desta iniciativa!

Agradeço ao Vitor Diel pelo convite.

Será possível criar narrativas a partir de uma lista?

Você já pensou em criar narrativas a partir de uma lista de supermercado, por exemplo?

Te parece uma ideia impossível ou muito banal?

Pra você, ideias para narrativas têm de ser grandiosas, sublimes ou transcendentes?

Pois vou te dizer que é possível sim criar narrativas bem interessantes partindo do estímulo de uma lista de supermercado e diversos outros tipos de lista. Os dispositivos de escrita criativa são diversos e sempre há mais e mais para serem criados. Muitas das vezes é em nosso cotidiano, aquele que nos parece mais corriqueiro, que encontramos possibilidades para buscar gatilhos de estímulo para nossa escrita criativa.

Existem diversos caminhos. No caso de uma lista de mercado, por exemplo, ela pode tanto ser incorporada na narrativa, como uma lista feita pela narradora ou pela personagem, como ela pode ser um capítulo todinho de uma história que você está escrevendo, ou seja, a lista pode figurar enquanto lista no texto se for um pedido da escrita, como a lista também pode funcionar como disparador de uma narrativa. Podemos a partir de uma inocente lista de supermercado criar uma narrativa superinteressante.

Para escrever não precisamos ir longe, precisamos muitas das vezes abrir o olhar, atentar para o nosso entorno e ler o mundo, sem dividi-lo entre banal e grandioso.

Na oficina de escrita criativa que eu facilito, chamada Escrever o cotidiano, proponho alguns exercícios que se utilizam da lista tanto como possibilidade de ferramenta para a criação de personagens, de motes para uma ideia, de inventário para um texto, como também fazemos nascer de uma lista narrativas superinteressantes que acabam por surpreender as próprias pessoas escritoras.

Geralmente, pelo uso cotidiano, a lista acaba por nos parecer algo pouco literário. Vou deixar aqui três títulos que trazem a ideia da lista em seus textos para que vocês possam perceber as possibilidades de uma lista:

  1. O pai da menina morta de Tiago Ferro (o romance é volta e meia perpassado por listas que ajudam a movimentar a narrativa e criar efeitos na leitura).

2. Sem vista para o mar de Carol Rodrigues (traz o conto Lista de compras para a festa de Miguel, no qual lista e narrativa vão se entrelaçando de maneira instigante).

3. O livro do travesseiro e Sei Shônagon (um romance todo escrito em listas que quadro a quadro vai nos dando as tintas e o sabor de sua época, a partir do olhar de uma dama da corte no Japão).

Em breve a oficina Escrever o cotidiano vai abrir novas turmas. Se tiver interesse em se inscrever na lista de espera para receber a divulgação é só mandar e-mail para escreverocotidiano@gmail.com demonstrando teu interesse.

Numa próxima eu volto aqui com exemplos de narrativas que surgiram das listas propostas na oficina.

Um abraço.

Marina.

Textos no mundo

Passando aqui pra contar as boas novas. Sobre os textos que estão indo pro mundo, encontrar pessoas.

Recentemente tive a dramaturgia “Carne de Segunda” selecionada na convocatória ACIONA – Dramaturgas em cena, da Cia. Senhas de Curitiba. “Carne de segunda” traz a história de uma mulher, um crime não solucionado, uma cidade do interior, os disse que me disse dos vizinhos em coro, as violências do machismo estrutural, a presença da justiça por entre estas teceduras todas, entre outras imagens, movimentos e poéticas.

“As curadoras Dione Carlos, Lígia Souza e Sueli Araújo se reuniram durante o mês de julho para realizar a análise dos 100 textos recebidos pelo chamamento lançado pela Cia. Senhas de Teatro, através do projeto CIASENHAS ACIONA – DRAMATURGAS EM CENA. Os 20 textos selecionados revelam a pluralidade de abordagens recebidas. ” (…)

Leia mais em: resultado da convocatória Cia. Senhas

E mais recentemente ainda, tive o conto inédito “Pitoco”, selecionado para a antologia Eu conto um conto, de textos para infância, da editora Philia. “Pitoco” conta a história de um menino que sonhava em deitar na praia e tomar água de coco (entre outras cositas más).

“É com muita alegria que a Equipe Editorial Philia anuncia o resultado da seleção dos contos inscritos através do Edital de Seleção de Contos infantis – Eu Conto um Conto. Após a leitura criteriosa dos 384 contos recebidos, e, considerando a qualidade excepcional de muitas narrativas, a Equipe Editorial Philia definiu escolher 78 contos infantis para compor a Coletânea Philia de Contos Infantis 2021 – Eu Conto um Conto.”

Leia mais em: resultado da antologia Eu conto um Conto

Alegrias possíveis em tempos tão difíceis.

Um abraço, Marina.

Em nossa cidade amarelinha era sapata

1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, céu. A pedra não pode cair na linha. O pé não pode pisar na linha. Você precisa lançar a pedra no número certo da vez. Ir pulando conforme os quadrados, às vezes ficar num pé só. No quadrado da pedra você não pisa. Você cata a pedra e você chega ao céu, em algumas versões do jogo você precisa voltar tudo depois de chegar ao céu e aí sim, somente na volta, catar a pedra. Os quadrados podem ser desenhados com giz de escola, tinta, carvão, ou aquele pedaço quebrado de tijolo laranja, e há quem faça tudo com fita adesiva.

Jogodeamarelinha.

Em nossa cidade o jogo de amarelinha também era chamado de sapata.

Vamos jogar sapata Cecília?

E eu sempre ia. Com ou sem convite. Adorava. Não perdia uma oportunidade. Jogar sozinha não era a mesma coisa. Não tinha ninguém pra gente ficar comparando os avanços e nem ninguém pra dizer que a gente tinha queimado. Eu sempre preferi os olhos externos. Por isso quando a Ágata estava junto era sempre melhor.

1,2,3…errei. A pedra queimou na linha. Não é hoje que eu chego ao céu.

E o que é que tem lá no céu mãe? Quem é que vai pra lá? Como é que se chega? Eu fazia essas perguntas e minha mãe dizia que só gente muito boa ia pro céu. Gente que não fala palavrão, que não responde aos pais, que não rouba, gente que reza e confia em Deus, gente que respeita os avós… (e de repente ela aumentava a voz perto da janela que dava pra rua)…gente que não é de safadeza, gente que contribui com a igreja, mulher que não é de se mostrar demais, mulher que não troca de marido que nem quem troca de calcinha, mulher que cuida dos seus filhos e do seu marido, mulher que não se dá ao desfrute… (a lista era muito grande, e eu fui aprendendo que era a forma de minha mãe dar o recado para as vizinhas próximas).

Na escola a gente sempre jogava sapata. Eu e as gurias. Era nossa brincadeira favorita.

1,2,3,4,5,6…errei. Dessa vez não foi a pedra que queimou na linha, mas eu tinha que ter dado a voltinha num pé só e eu não consegui. Deu uma fraqueza na perna direita.

Ontem à noite eu quis usar uma bermuda azul e uma blusa do homem aranha que eu gostava. A bermuda era minha, a madrinha tinha me dado de presente. Eu adorava. Simplesmente adorava. E a blusa do homem aranha era do meu irmão, mas ele tinha me emprestado. Só que meu pai disse que não podia. Eu não quis saber. Se o meu irmão pode, por que eu não podia? Ele disse que a filha dele não ia sair na rua parecendo um guri de jeito nenhum e que se eu não entendesse por bem, ia ser por mal. Foi por mal, óbvio. Daí foi ruim de dar a voltinha num pé só. Ainda lateja.

…gente que não é de prevaricações com o marido das outras, gente que não fica mostrando os seios, gente que educa os filhos dentro da igreja, gente que não permite que os filhos façam o que quiserem, gente direita de família, gente que não é depravada, gente trabalhadora, gente de bem… (dessa vez eu não perguntei quem ia pro céu, mas minha mãe me catou no colo e ficou ali naquela ladainha pra rua toda ouvir. Eu ficava pensando quem ali tinha que escutar aqueles recados. Meu pai abriu a porta forte. Minha mãe me soltou na hora). Tu precisa incluir nessa lista uma coisa aí, mulher. (Ela pegou papel e caneta pra anotar). Sapata. Tu precisa colocar aí que sapata não vai pro céu. Não tem jeito de ir. Coisa mais nojenta desse mundo. (Minha mãe anotou tudinho).

Sapata não vai pro céu? Coisas têm que ir ou não pro céu? Jogos? E quem joga sapata, vai pro céu? Não ousei perguntar sobre nada disso. Mas não dormi à noite pensando naquilo: sapata não vai pro céu. Minha mãe tinha anotado. Ela ia gritar isso na próxima cantilena na janela.

Vamos jogar sapata Cecília?

Tudo bem se a gente chamar de amarelinha agora Ágata?

Por quê?

Sapata não vai pro céu! Eu acho que é porque já tem o céu nela mesma, mas eu prefiro ir pro céu porque a minha mãe diz que é bom lá.

A minha também. Mas…a gente joga amarelinha agora?

É, é a mesma coisa.

Não muda nada…

Não.

1,2,3,4,5,6,7,8,9…errei. Nas portas do céu eu deixei a pedra cair da minha mão na hora de catar ela no chão. Num contragolpe ela me escorrega entre os dedos. É que eu fiquei tão impressionada olhando pro quadrado de céu da sapa…amarelinha, que eu perdi a noção de tudo. Tudo bem, eu tento na próxima. Uma hora vai dar. Eu vou conseguir chegar ao céu e vencer o jogo. Não é difícil. A Ágata sempre consegue.

…sapata não vai pro céu. Coisa nojenta, pouca vergonha… (passo reto escondida da minha mãe. Dessa vez ela não me pegaria pra ficar pendurada na janela no meio do sermão dela).

Fui pro meu quarto e fiquei pensando na festa junina que ia ter na rua. Nessa eu podia ir. A mãe e o pai deixavam porque era da igreja. A gente só não podia dançar e nem comer demais que era pecado. Também não podia ficar perdendo tempo nas barraquinhas de brincadeira, e a barraquinha do beijo era invenção destas mulheres putas da rua. Ninguém sabia como o padre Genaro tinha aceitado. Barraca do beijo nem pensar!!! Mas podia comer um pouco, desde que fosse nas barraquinhas das colaboradoras da igreja, porque aí sim o destino do dinheiro era confiado. Mas eu gostava mesmo assim. Porque eu via gente diferente. A rua ficava cheia de gente do bairro todo, e aí no meio de tanta gente diferente, gente até do centro da cidade, meu pai e minha mãe não eram quem eles eram e nem eu era filha deles e aí eu podia ser quem eu quisesse. E dava pra jogar sap… amarelinha com gente diferente.

Essa festa, mulher. Sei não. Não sei se Cecília deve ir.

Mas a menina adora.

Mas tem que ficar de olho nela, mulher.

Meu pai anda muito preocupado. Acho que ele vai até à prefeitura pra remover a sapata. Não sei como é que ele pode mudar o nome de um jogo, mas ele quer fazer isso.

1,2,3,4,5,6…errei. Mas não queimei, nem deixei a pedra cair por entre os dedos. Dessa vez foi a Ágata que me chamou. Veio correndo. Língua pra fora. Tinha perguntado pra mãe essa coisa de sapata e de céu.

Tu entendeu tudo errado.

É?

Minha mãe disse que teu pai tá falando de outra sapata.

Qual?

Uma mulher.

Chamada sapata?

Não. Que ele conhece. Que é sapata.

Então não é o jogo?

Não. É a mulher.

Mas como?

Dessas aí que fica com mulher.

Fica?

Beija e tudo. Que nem artista de novela.

E pode isso?

Não é normal, por isso teu pai tá assim.

Então pode falar que vamos jogar sapata?

Poder, pode, mas a mãe disse que é até bom evitar falar isso agora. Eu já me acostumei a falar amarelinha.

É, eu também…

Mentira, eu não tinha me acostumado, mas não queria falar sapata, mesmo tendo esclarecido os fatos. Sobretudo tendo esclarecido os fatos.

1,2,3,4…errei. Mas é porque no meio da festa eu não consigo mesmo me concentrar em chegar ao céu. Tem tanta luz, tanto cheiro, tanta comida boa e gente bonita. Eu queria ter vindo com a blusa do homem aranha. Meu irmão emprestou de novo, mas achei melhor não arriscar. Preferi aproveitar a farra. De longe vejo minha mãe gesticulando e reclamando:

Marcha de carnaval não é música de Deus, Gorete. Tem que falar pro padre proibir.

Ela saiu atrás do padre junto com a dona Gorete. E eu avistei de longe o carrinho de maçã do amor. Não era das comidas que eu podia comer, mas eu gostava tanto. Corri em direção ao carrinho, por entre as pernas que iam e vinham em diversos ritmos levantando poeira do chão. Cheguei na frente daquele mar de bolinhas vermelhas brilhantes. Mas não era mais a mesma moça quem vendia. Era uma outra que eu não conhecia.

Oi, quer uma?

Quero sim. Mas cadê a dona Luísa?

Minha mãe está muito gripada. Esse ano tive que vir.

Aí começa a tocar uma marchinha: “Maria sapatão, sapatão, sapatão, de dia é Maria, de noite é João”. E umas pessoas da rua passam pelo carrinho de maçã do amor e mexem com a moça filha da dona Luísa. Ela fica sem graça. Fecha a cara. Tenta se concentrar. Meu pai vem vindo de longe gritando:

O que tu tá fazendo com a minha filha, sua sapata?

Eu fico querendo que aquela música pare de tocar. Onde está a minha mãe que ainda não achou o padre? Eu só quero que aquela música pare de tocar. A moça deu a maçã do amor pra mim bem na hora que começou a tocar a música e meu pai vai achar que eu…

A festa ia acabar alguma hora mesmo.

1,2,3,4,5,6,7,8,9…errei. Dessa vez foi de propósito. Encarei o céu de cima. Aquela palavra escrita de resto de tijolo. Lembrei da voz da minha mãe. Joguei a pedra bem longe.

Enfiei as mãos na mochila e catei minha maçã do amor. Eu consegui uma nova com a moça. Encontrei ela na volta da escola e dessa vez eu estava sem a Ágata. Aí fiquei de papo com ela um pouco, olhando bem pros dois lados da rua. Perguntei da dona Luísa. Estava melhorando. Mandei um abraço. Ela agradeceu e me deu uma maçã do amor, já que naquele dia a minha tinha caído no chão no meio do entrevero. Agradeci e escondi a maçã do amor no fundo falso da minha mochila, junto com a blusa do homem aranha que meu irmão me deu de presente. Ficou com pena de mim pelo que aconteceu depois da festa.

Tirei o plástico transparente e barulhento e fiquei olhando meu reflexo na casca brilhante de caramelo vermelho daquela maçã do amor. Em seguida dei uma baita duma mordida nela, bem grande, a maior que eu pude. E fiquei ouvindo o crack-crack que fazia dentro da minha boca. Meu reflexo sumiu.

Deitei no chão e fiquei olhando pro céu. Se lá não tinha maçã do amor e nem blusa de homem aranha, então lá não devia ser um lugar tão bom assim. Eu que não ia.

Crack-crack-crack-crack.

conto publicado no livro Em nossa cidade amarelinha era sapata, editora Patuá, 2019.

Literatura com representatividade

Você é uma mulher lésbica ou bissexual, e gosta de se sentir representada nas narrativas literárias?


Ou então, você é uma leitora ou um leitor que se interessa pelas diversas perspectivas de mundo que a literatura pode trazer?


Se você respondeu sim a uma destas perguntas, esta antologia é perfeita para você.


Antes que eu me esqueça” reúne 50 autoras lesbis que estão vivas escrevendo literatura hoje no Brasil.


Entre prosa e poesia, a antologia tem como tema a memória e conta com nomes como Natalia Borges PolessoAline MirandaDia NobreMonique Malcher, entre tantas outras potências que produzem literatura contemporânea em nosso país.


A organização é de Gabriela Soutello, e a editora é a Quintal, uma editora que publica obras com autoria de mulheres.


Alegria em dizer que sou uma das autoras, participando com o conto “8 fragmentos do corpo-cidade“.


E então, bora chegar juntas e juntos nessa?


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Estes e outros escritos

Olá, bem-vinde ao meu blog do site.

Mas, por que blog do site?

Calma, eu explico.

Aqui no site o espaço do blog servirá para compartilhar notícias, projetos e alguns textos que foram publicados em materiais impressos, para que vocês possam ter acesso e todo o movimento da minha vida de artista e escritora.

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